quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Jangada de pedra ou o Ceará é uma ilha (ensaio sobre a insanidade da xenofobia)


Como todos já esperavam, o resultado do primeiro turno das eleições motivou uma série de comentários preconceituosos contra nordestinos e nortistas. Devo dizer que minha primeira reação é de responder o ódio com mais ódio.

Lembrei, então, do livro A Jangada de Pedra, de José Saramado, e da história fictícia que falava sobre o deslocamento da península ibérica do restante da Europa e me dei conta de que era exatamente assim que me sentia. Um terremoto evocado por palavras de ódio deslocou o meu desejo para longe, me levou a imaginar que o meu solo é uma jangada que está sempre de partida.

Então, me pergunto se já não estávamos nessa jangada de pedra há muito tempo. Será que a diversidade do Brasil nos une ou nos separa? Em tempos de redes sociais me sinto mais desconectada do que nunca! Não consigo me sentir ligada aos que nos repelem. Estamos longe, estamos distantes, somos uma ilha enorme no meio do oceano.

Então, percebi que não se trata de eleições. Será que é por sermos diferentes e, principalmente, por não aceitarmos abrir mão disto? Somos de onde somos, pensei! Mas, afinal, qual nossa etnia? Somos índios, negros, árabes, portugueses, holandeses, coreanos? E os portugueses, o que são? Turcos, romanos, hebreus, gregos? Um momento, a pergunta não pode ser de onde somos, pois se voltarmos à raiz de tudo chegaremos ao mesmo lugar. Mas se não é nossa origem, o que gera tanta ira?

Pensando sobre isto, me peguei "limpando" meus contatos, tirando todos que tinham uma opinião diversa da minha e vi que eu estava fazendo o mesmo! Não podemos mais conviver com opiniões diferentes, disse o facebook e o twitter e nós acreditamos facilmente. O Brasil é um país de diferenças, a Terra é um planeta de diferenças e estas diferenças não nos unem, mas nos constituem. Agradeço agora à direita, pois sem ela não saberia que sou de esquerda; agradeço aos patriarcalistas, pois a partir deles consigo definir minha porção feminista; quanto mais manifestações xenófobas eu vir nas redes sociais, mais reafirmarei minha alma nordestina.

Continuo repudiando qualquer tipo de preconceito, mas consigo reconhecer que a internet não aumentou a intolerância, ela apenas mostrou para nos os intolerantes que sempre existiram e, agora que eles mostraram quem são, compreendemos melhor o quão diferentes somos e temos a chance de combatê-los com denúncias, processos e palavras de amor.

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